sábado, 2 de fevereiro de 2013

Leia e imprima o texto, grife as palavras que você não sabe o significado e traga para sala de aula para uma pesquisa e um debate do texto.

onstrução, (des)construção. Operário-livre?
“Operário”: trabalhador ou artífice que, mediante salário, exerce uma ocupação manual. “Pedreiro”: operário que trabalha em obras de pedra, cimento e cal.”Construção”: ato ou efeito de construir. Edificação. “Construir”: dar estrutura a; edificar. Formar, conceber; elaborar.“Constructo”: aquilo que é elaborado ou sintetizado com base em dados simples; conceito. “Livre”: que é senhor de si e de suas obrigações; dotado do poder de escolha; que não está sob o jugo de outrem.

Pedreiro-livre:maçom. Do latim, sculptores lapidum liberorum. Durante o período medieval, a palavra "livre" foi prefixada ao nome "pedreiro", formando a expressão "pedreiro-livre”. Em inglês, ,freemason; em francês, franc-mason; em alemão, freimaurer. Livre, porque tinha conhecimentos e técnicas não encontradas em poder dos outros artesãos; era muito mais trabalhador livre do que servo. Os pedreiros-livres construíram a maior parte das catedrais góticas e outros prédios públicos na Europa continental e na Grã-Bretanha.

Liberdade não é mais uma velha calça jeans desbotada. Terá sido um dia? Se nem os hippies velhos de guerra (algumas expressões populares são tão paradoxais!) eram livres, que dizer dos pedreiros?

O tema do operário da construção civil é uma constante na música popular brasileira. Menos comumente aparece na literatura ou no teatro. Neste último, é memorável a repercussão que teve o monólogo “Muro de arrimo”, de Carlos Queiroz Telles – interpretado por Antônio Fagundes e encenado por Antônio Abujamra. –, cuja ação se passa duas horas antes do jogo de futebol em que o Brasil é eliminado pela Holanda na Copa do Mundo, na Alemanha, em 1974. Segundo o autor, a idéia inicial surgiu de uma notícia de jornal: “No dia 28 de julho de 1974, jornais de São Paulo noticiaram a morte do pedreiro José Ribeiro, 35 anos, morador em Guarulhos. Tuberculoso, José morreu embrulhado numa bandeira brasileira, manchada de sangue, poucos dias depois de a seleção brasileira ter sido eliminada na Copa do Mundo”.

Lucas, a personagem da peça, está fazendo um muro no alto de um prédio em São Paulo. Atento ao trabalho interminável, ouve seu radinho/tijolo, acompanha o jogo. O muro, amontoado de tijolos, está sendo construído. Seu pedreiro, nada livre, desconstruído. José/Lucas revela seus sonhos e infortúnios e, assim como milhares de outros “construtores”, ilude-se com falso brado de “Pra frente, Brasill!” Não será um jogo de futebol, porém, que mudará o curso da história recente do país. O futebol é uma tábua de salvação, assim como o andaime é (seria?}, no caso de a corda arrebentar. Curioso que o operário que fica na corda bamba seja denominado, na construção civil, “ cordeiro”...

Teixeirinha, compositor gaúcho, entrou nesse clima de euforia, em “A vida de operário”: “ No outro dia é o mesmo/ Lá vai ele sorridente/ Pegado na construção/ Levando o Brasil pra frente/ Se não fosse o operário/ Não existia grandeza/ O nosso Brasil não era/ Um gigante de riquezas/ Que Deus não deixe, operário!/ Faltar pão na sua mesa!”

Difícil imaginar um pedreiro (desdentado?) sorridente às quatro horas da manhã...

Da importância do pedreiro para a edificação do país ninguém duvida, mas andamos fracos da memória. Alguns compositores insistem em reativá-la. Não que a denúncia vá mudar muita coisa; fica, porém, registrada em ata. É o caso de Zé Geraldo, em “Cidadão”: “Tá vendo aquele edifício, moço?/ Ajudei a levantar/ Foi um tempo de aflição/ Eram quatro condução/ Duas pra ir, duas pra voltar/ Hoje depois dele pronto/ Olho pra cima e fico tonto/ Mas me chega um cidadão/ E me diz desconfiado, / tu tá aí admirado/ Ou tá querendo roubar?/ Meu domingo tá perdido/ Vou pra casa entristecido/ Dá vontade de beber/ E pra aumentar o meu tédio/ Eu nem posso olhar pro prédio/ Que eu ajudei a fazer.”

No criativo mote de “Pedro Pedreiro”, de Chico Buarque, o artesão, Pedro, é construído da matéria de sua arte, as pedras. E o “P” maísculo, no sobrenome, nos permitiria a licença morfológica de considerá-lo nome próprio, de família: “Esperando, esperando, esperando, esperando o sol/ Esperando um filho pra esperar também”. Pedreiro de ofício e sobrenome. Pedra arraigada no sangue. Amanhã será outro dia? Difícil:”” Pedro pedreiro pedreiro esperando o trem/ Que já vem, que já vem, que já vem, que já vem...”

Um pedreiro espera, na “gare”, os trens que não virão, fica a ver navios. E um outro (na “Construção” dos prédios de Buarque) fica à deriva: “Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago/ Dançou e gargalhou como se ouvisse música/ E tropeçou no céu como se fosse um bêbado/ E flutuou no ar como se fosse um pássaro/ E se acabou no chão feito um pacote flácido/ Agonizou no meio do passeio público/ Morreu na contramão atrapalhando o tráfego”.

Vinicius de Moraes, que de Poetinha não tinha nada, constrói seu operário em “O operário em construção”. Há toda uma alegoria em que a epígrafe é retomada no desenrolar do poema: “E o Diabo, levando-o a um alto monte, mostrou-lhe num momento de tempo todos os reinos do mundo. E disse-lhe o Diabo:/ – Dar-te-ei todo este poder e a sua glória, porque a mim me foi entregue e dou-o a quem quero; portanto, se tu me adorares, tudo será teu./ E Jesus, respondendo, disse-lhe:/
– Vai-te, Satanás; porque está escrito: adorarás o Senhor teu Deus e só a Ele servirás. (Lucas, cap. V, vs. 5-8). No clímax da narração poética, o Patrão/Satanás também tenta seduzir o Operário/Jesus: “– Dar-te-ei todo esse poder/ E a sua satisfação/ Porque a mim me foi entregue/ E dou-o a quem bem quiser./ Dou-te tempo de lazer/ Dou-te tempo de mulher./ Portanto, tudo o que vês/ Será teu se me adorares/ E, ainda mais, se abandonares/ O que te faz dizer não.”

Convicto, “O operário disse: Não!/ E o operário fez-se forte/ na sua resolução.”

Este pedreiro não morreu na contramão, conseguiu seguir a mão certa, que lhe garantiu a vida. Não foi um processo rápido, amadureceu à medida que empilhava tijolos e construía paredes:” Mas ele desconhecia/ Esse fato extraordinário:/ Que o operário faz a coisa/ E a coisa faz o operário./ De forma que, certo dia/ À mesa, ao cortar o pão/ O operário foi tomado/ De uma súbita emoção/ Ao constatar assombrado/ Que tudo naquela mesa/ – Garrafa, prato, facão – / Era ele quem os fazia / Ele, um humilde operário, / Um operário em construção. / Olhou em torno: gamela / Banco, enxerga, caldeirão / Vidro, parede, janela / Casa, cidade, nação! / Tudo, tudo o que existia / Era ele quem o fazia / Ele, um humilde operário / Um operário que sabia / Exercer a profissão”.

O processo de dupla mão mantém embrutecedores os brutos “pedra, cimento e cal”. .”Descoisifica”, entretanto, o pedreiro, deixando-o mais livre, na conclusão do poema: “Uma esperança sincera/ Cresceu no seu coração/ E dentro da tarde mansa/ Agigantou-se a razão/ De um homem pobre e esquecido/ Razão porém que fizera/ Em operário construído/ O operário em construção”.

Mais uma vez a velha gramática normativa serve para fundamentar a “trans-form-ação”. Já no título do poema, “O operário em construção”, há ambigüidade na expressão “em construção”: pode ser entendida como adjunto adverbial de lugar, “na construção”, e como epíteto de “operário” “que se está construindo”. O artigo definido “o” individualiza, define o pedreiro em questão, ao mesmo tempo em que ele também representa todos os operários que entrarem no processo de “em construção”. Nos últimos versos, o uso do particípio “construído”, na voz passiva, altera uma trajetória de vida. Aquele que numa primeira etapa tinha sido construído pelos outros, num segundo momento estava em construção, construindo-se e finalmente já se construiu, finalizou sua edificação. De sujeito paciente, objeto da história (é bom recordar que, na voz ativa, ele seria objeto direto, “Construíram o operário”), passa a ser agente da própria história. Individual, na primeira descoberta; social, depois:” E um fato novo se viu/ Que a todos admirava:/ O que o operário dizia/ Outro operário escutava.”

O processo de divulgador da nova ordem – mundial? – dá-se a partir de uma descoberta: “Não sabia, por exemplo/ Que a casa de um homem é um templo/ Um templo sem religião/ Como tampouco sabia/ Que a casa que ele fazia/ Sendo a sua liberdade/ Era a sua escravidão.(...}E como tudo que cresce/ Ele não cresceu em vão/ Pois além do que sabia/ – Exercer a profissão –/ O operário adquiriu/ Uma nova dimensão:/ A dimensão da poesia”. A poesia-libertação lhe permite reassumir a velha função medieval de artesão dono de seu próprio nariz, de pedreiro-livre, livre como o pedreirinho joão-de-barro, que constrói sua própria casa, para ele mesmo morar. Poderá, enfim, exercer a cidadania, tão perdida na não liberdade.

No Norte/Nordeste, o operário pelo menos era dono de sua terrinha, ao contrário das novas terras que “descobre” em outras plagas. Era cidadão; hoje, transformam-no -no em coisa. Como enfatiza Zé Geraldo: “ Fui eu quem criou a terra/ Enchi o rio fiz a serra/ Não deixei nada faltar/ Hoje o homem criou asas/ E na maioria das casas/ Eu também não posso entrar”.

“Criou asas” porque os proprietários querem edifícios altos? A ambição pelas alturas de cimento só não favorece o que está acostumado com a terra. “E tropeçou no céu como se fosse um bêbado/ E flutuou no ar como se fosse um pássaro/ E se acabou no chão feito um pacote flácido/ Agonizou no meio do passeio público/ Morreu na contramão atrapalhando o tráfego”.

Longe de nós querermos fazer qualquer proselitismo, todavia os maçons, pedreiros-livres, acabaram inspirando nossas elocubrações. De corporações que reuniam trabalhadores manuais passaram a constituir grupos pensantes. Do concreto ao abstrato. Da construção exclusivamente edificação de prédios ( os arquitetos ainda não se tinham encontrado realmente como desenhistas do desenho, mágico ou não) ao conceito: constructo.

“Uma esperança sincera/ Cresceu no seu coração/ E dentro da tarde mansa/ Agigantou-se a razão/ De um homem pobre e esquec

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